sábado, 25 de outubro de 2014

DILMA GANHOU DE POUCO, VENCEU DE MUITO

25 de outubro de 2014 por Paulo Moreira Leite

No último debate, a presidente precisava empatar, mas mostrou mais consistência do que adversário.
O debate de ontem terminou na primeira pergunta.  Aécio Neves tentou usar a última edição da VEJA para colocar Dilma contra a parede. A presidente deu uma resposta a altura, desqualificando uma denúncia que nem seu autor — nem a revista que a publicou — conseguem sustentar com base em provas. Foi uma colocação firme, sem piscar.
O debate terminou aí porque, como se sabe, o último debate de uma campanha envolve uma questão essencial. Quem está na liderança das pesquisas joga na defesa e pode ganhar mesmo que empatar. Quem está atrás precisa tentar virar o jogo de qualquer maneira, mas isso só se consegue quando o interlocutor oferece brechas e oportunidades.
Num confronto que tem algo de uma luta de boxe, é preciso encaixar golpes no rival — uma forma de mostrar ao juri de eleitores, indecisos e pouco firmes, que ele tem pontos fracos que precisam ser levados em consideração. Mas a presidente atuou como se estivesse protegida por uma couraça.  Quando a primeira revista não deu certo, Aécio falou de uma reportagem da Istoé.
Entre o 5 de outubro, dia do 1 de turno, e o debate de ontem, o eleitorado brasileiro assistiu a uma outra campanha.  Durante um ano inteiro, o discurso da oposição — qualquer que fosse seu candidato — colheu o benefício da postura dos principais meios de comunicação contra o governo. Tratados como questões prioritárias da eleição, temas como inflação, baixo crescimento, incompetência administrativa, Petrobras, dominaram a agenda da primeira fase, graças também a um auxílio numérico, também. Em cada confronto presidencial, ocorria um conflito de 6 contra 1, sem alívio para a presidente.
No segundo turno, o debate teve outro horizonte.
Graças ao horário político, o domínio dos meios de comunicação foi amenizado. As redes sociais também mostraram seu alcance e sua garra. Tudo isso permitiu a Dilma defender os pontos de vista do governo, ajudando sua campanha a reencontrar a base de apoio que vinha construindo aos trancos e barrancos desde a posse. Para dois terços do eleitorado, a inflação ficará como está ou pode cair. O desemprego pode diminuir ou ficar na mesma proporção. Para 44%, o crescimento pode melhorar.
Ao derrotar Marina Silva no plano das ideias e dos argumentos, num jogo que foi bruto de parte à parte,  Dilma não venceu apenas uma candidatura. Também derrotou uma visão política, a noção de que o mercado tem as melhores e mais eficientes respostas para um país como o nosso. Fazendo uma campanha muito mais à esquerda do que seu governo, a  presidente mostrou realizações. Voltou ao discurso pobre x rico que está na origem do PT — e de toda organização política nascida pelo reconhecimento da existência de uma luta de classes nas sociedades contemporâneas.
O reconhecimento dos dramas mas também dos benefícios do presente permitiu ao eleitorado recordar o “passado”, aquela parte da história do país com a qual os herdeiros de 500 anos de governo tem uma compreensível dificuldade para conviver e explicar. Com uma visão basicamente identica, que lhe permitiu diversas ações combinadas de auxílio-mutuo, Aécio ultrapassou Marina — mas já estava sem uma perna quando chegou ao segundo turno e precisava enfrentar um debate cara a cara. Não por acaso, perdeu todos os confrontos, inclusive aquele em que foi o mais agressivo. Empurrado para um canto conservador, debateu-se em contradições insolúveis. As intervenções de Armínio Fraga como candidato a ministro da Fazenda trouxeram mais danos do que benefícios a candidatura, em especial depois de uma derrota amarga num debate — assistido por todos os entendidos — para Guido Mantega.
Aécio tentou, ontem, usar a AP 470 contra o governo — missão difícil para quem não oferece respostas convincentes para o mensalão PSDB-MG, que o eleitor hoje conhece e condena até com mais vigor, pois não levou a uma única punição. Denunciou o porto de Mariel, em Cuba, um negócio que é difícil de condenar do ponto de vista comercial — mas serve para explorar o anti-comunismo primitivo de fatias conservadoras do eleitorado, apenas.

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